A negação da essência da vida
Nos tempos presentes, a depressão
tornou-se um grande desafio para a nossa fé e para a nossa vida
espiritual. Ela é cada vez mais uma “doença popular”. Todos falam dela.
Todos convivem com ela. A desintegração familiar,
bem como a perda dos valores éticos, morais e religiosos, tem sido uma
das principais causas da depressão. Nestes últimos anos, a dimensão
psicológica e psiquiátrica da depressão tem recebido uma atenção
especial. A depressão exige uma forma de oração que
considere a pessoa na sua dimensão integral. O caminho espiritual é,
nestes casos, particularmente exigente pois deve ter sempre em conta a
situação psíquico-afetiva em que a pessoa se encontra.
A experiência da depressão é marcada pelo
vazio interior e pela ausência de qualquer vitalidade. É a negação da vida em sua essência. É a
perda do entusiasmo e da esperança. A pessoa sente-se paralisada na sua criatividade e nas suas competências. As forças estão atrofiadas. Com isso,
a tristeza ocupa cada vez mais o espaço da interioridade. A vida não mais corresponde às expectativas que nela depositámos.
A superação de uma falsa imagem
Contudo, a depressão pode ser vista como
um convite para que a pessoa supere todos os esquemas e regras que contradizem a sua essência de vida.
São momentos para superar as ilusões, os sentimentos de culpas e fixações negativas construídas ao longo dos anos.
É hora de nos despedirmos de uma auto-imagem falsa que não corresponde à realidade.
Só assim nos tornaremos sempre mais aquilo que somos verdadeiramente, aptos a
aproximar-nos sempre mais da verdadeira imagem, única e original, que Deus formou em cada um de nós. Não podemos ser sempre o melhor, nem com certeza o mais belo ou o mais inteligente. Mas, é isto importante?
As pessoas deprimidas olham para o
seu passado de maneira negativa. As experiências vividas são deslocadas
para uma perspectiva de culpa e vergonha. As pessoas deprimidas
normalmente tendem a afastarem-se dos outros. Elas
têm medos de serem excluídas e rejeitadas. A sua auto-estima é baixa e
torna o seu relacionamento com outras pessoas uma fonte de perturbação.
Os familiares de um depressivo retraem-se com a impressão que todo o
esforço é inútil. A pessoa deprimida não consegue
alegrar-se com nada, com nenhuma visita, com nenhum elogio. Tudo se
torna insuportável para ela.
A depressão passa a ser assim um escudo de uma falsa proteção.
Acolhimento da própria depressão
É preciso estabelecer uma relação positiva e amorosa com a depressão.
A aceitação da própria depressão pode levar a uma maior clareza interior, bem como a uma profunda experiência de Deus.
No meio da depressão é possível sentirmos em certos momentos,
na nossa extrema fragilidade, uma extraordinária proximidade com Deus.
Quando o mundo exterior se escurece para nós, voltamos os nossos olhos para dentro de nós mesmos.
A depressão leva-nos sempre a questionar alguma coisa de nós mesmos que não está bem ou que ultrapassou os limites. É aqui que,
em vez da fuga devemos seguir o caminho do acolhimento da depressão.
O primeiro passo consiste em
familiarizar-se com a depressão e reconciliar-se com os sentimentos de
culpa. Ela não pode ser vista como “inimiga”. Quando a depressão é vista
como “inimiga”, estabelece-se uma luta interna
e a pessoa sente que as suas forças sucumbem e o desânimo acaba por
influenciar decisivamente as nossas decisões e os nossos sentimentos.
Querer agradar sempre
A depressão pode ser proveniente
também de um perfeccionismo enraizado no fundo da alma, onde a pessoa
quer sempre ser bem vista por todos, reconhecida e estimada por todos.
Por isso ela sente-se na obrigação de atender
a todas as expectativas, bem como, de corresponder sempre, de agradar
sempre. Ela não se permite errar. Como isso não é possível, então a
depressão passa a dominá-la.
Uma atitude de acolhimento das próprias fragilidades, pecados e frustrações possibilitam um caminho de superação e dá nova vitalidade.
Perdoar a si mesmo talvez seja o ponto mais difícil. A misericórdia é praticada só em direção aos outros e nunca para com sua própria pessoa. O rigorismo se torna uma lei interna.
Uma possibilidade de acolher a depressão é aprender a escutar o
próprio corpo. Quanto mais, de forma amorosa, a pessoa prestar atenção
às suas próprias reações físicas ou emocionais, maior possibilidade há
da depressão se transformar em novas metas e projetos.
Corpo e alma bloqueados
A pessoa deprimida sente um
bloqueio generalizado. O seu olhar é rígido. Os membros do corpo
tornam-se pesados. Muitas pessoas deprimidas não conseguem sair da cama e
muito menos da casa. Carregam um grande sentimento de
culpa. É uma carga que vai para além das suas forças. Elas têm a
impressão de terem feito tudo errado. Acreditam que, pelo simples fato
de estarem vivas, já são culpadas. Sentem a necessidade de se
desculparem constantemente, mais tais pedidos de desculpas
não mudam nada a sua atitude. Permanece nelas a sensação de que são
sempre pessoas perdedoras e vencidas. Daí a recusa em assumir a própria
vida. E tal comportamento pode levar até o suicídio.
A desmotivação
As pessoas deprimidas são inquietas
e ao mesmo tempo, parecem paralisadas. Elas não descansam em si mesmas,
no bem-estar da vida, mas estão totalmente divididas. As pessoas
deprimidas parecem ter os olhos vendados. Não conseguem
ver a beleza na natureza, no mundo e nas pessoas. É uma sensação de
vazio absoluto. É a ausência de qualquer forma de vida; de qualquer
direito à vida. O deprimido está no meio de tudo, mas não vibra com
nada.
A pessoa deprimida, por vezes,
precisa da presença de outras pessoas e, ocasionalmente, tem necessidade
de falar sobre a sua vida. Ela tem a impressão de ter menos
valor do que os outros. Considera-se incapaz e lenta. Em tudo se
sente inferior e coloca-se em segundo plano. Está sempre desmotivada.
Vem logo o cansaço e uma das fugas deste esgotamento
é o sono e a inércia. Porém, em geral, não consegue dormir. Permanece
acordada e com os pensamentos atormentados. Torna-se assim uma pessoa
sempre cansada e esgotada.
O desejo de amor e reconhecimento
A pessoa deprimida carrega dentro
de si um grande desejo por amor, por atenção e reconhecimento. Quando
era criança recebeu pouco amor. Teve que se adaptar à situação. Em seu
íntimo ficou uma lacuna interior.
Uma pessoa deprimida anseia por
amor. Quer ser merecedora do amor e atenção de alguém. Para isso, ela é,
por vezes, capaz de se sacrificar pelos outros mas na maior parte das
vezes é um sacrifício por ela própria. Dá tudo
de si para conseguir um pouco de amor, mas quanto mais se desgasta,
mais o vazio aumenta. Quanto maior for o desejo por amor, maior se torna
o sofrimento, justamente pela falta de amor.
Dentro de cada um de nós existe uma fonte de amor. A pessoa deprimida não percebe mais isto.
Ao perceber que o amor já está
dentro de si, a pessoa dar-se-á então conta que não precisa mais
depender do amor alheio e assim ir superando a depressão, mas depende
dela se irá viver desta fonte ou não.
A abertura para Deus
A pessoa deprimida parece ter
perdido até mesmo o sentido da oração. A depressão confunde os
pensamentos e rouba-lhe toda a concentração. Nem sempre Deus tira a
depressão. A pessoa atribui a Deus aquilo que é de sua responsabilidade.
Daí a decepção com Deus. Rezar pode ser também uma luta com Deus. Jesus
compreende a oração de maneira diferente. Ele abre para o Pai o seu
medo, a sua impotência e a sua tristeza. Pede ao Pai que afaste o cálice
amargo da dor e da cruz. Mas pede também
ao Pai que se faça a sua vontade. Na oração, voltamo-nos para Deus a
partir de dentro de nossa depressão. Eu abro a minha tristeza para Deus
e peço-lhe que me livre dela. Mas, ao mesmo tempo, eu
entrego-me a Deus. Eu confio em Deus. Ao olhar para Deus, a minha
depressão vai amenizando. Ela deixa de me dominar totalmente. Nem
sempre a oração nos tira a depressão, mas ela dá-nos a firmeza diante do
sofrimento.
Um Deus presente
A oração não é um rito exterior,
nem um toque de magia e cura imediata. Em primeiro lugar, entramos em
contacto com o nosso interior, onde Deus habita em nós. Neste espaço a
força de Deus é maior. Na oração há sempre uma
conquista nova. Na oração sentimos a força de Deus. E onde Deus está, o juízo da depressão não tem a última palavra sobre a pessoa.
Quem for perseverante na oração,
irá experimentar o direito à vida em plenitude. Percebe que não é mais
dominado pelo desespero. A oração levanta a pessoa e confere-lhe o
direito de ter esperança. Na
entrega total a Deus, o Senhor da vida.
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